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Petrópolis, Rio de Janeiro, Brazil
Sou um homem comum, carioca, nascido em 12 de outubro de 1954, portanto, com 59 anos, 4 casamentos e até agora, nenhum funeral. Antes de tudo, sou Flamengo. Em seguida, radialista - Cidade, Fluminense, Panorama, Imprensa e (webradios) Radiovitrola e Radionavaranda. Criei, produzi e apresentei os programas Revolution, na Flu; Os Vizinhos Que Se Danem, na Panorama; Radionor Tum Tum, na Radiovitrola; e Pelo Telefone, com Carlos Savalla, na Radionavaranda. Publicitário: redator (criativo,como chamam por aí), consultor de marketing e de planejamento. Fiz parte da equipe de criação e produção do Rock in Rio I, na Artplan, Baterista, letrista, compositor, produtor, roteirista de espetáculos, diretor artístico e de shows, produtor musical e artístico. Finalmente, sou canhoto e, segundo o meu filho, um ótimo pai. Só isso me bastaria.

terça-feira, 15 de setembro de 2009

SINTÁGMAS E PARADIGMAS


Tenho ouvido repetidas vezes em ambientes um pouco mais cultos que a média, comentários ásperos e às vezes até indignados sobre o mau uso do idioma português pelo povo brasileiro.

De fato, quando lemos em sites de Portugal, é de causar-nos profunda inveja, na maioria das vezes, a propriedade com que os portugueses conjugam verbos, adequam pronomes e constroem sentenças.

Eu, de cá, desde já, afirmo que me recuso a adotar o tal acordo. Pra mim, além de não fazer o menor sentido alterar minha forma de escrever em função de uma unidade que jamais irá existir, não me sinto obrigado ou constrangido a fazê-lo, posto que não vou me candidatar a vaga em concurso nem dar aulas de qualquer espécie. Continuo, portanto, a escrever como sempre escrevi.

Acho mesmo que o problema a que se referem os indignados não passa por aí e sim pela forma da comunicação em si.

É verdade. Cada vez mais menos as pessoas se expressam com uma fluência minimamente aceitável. Nem me atenho às modernas formas contractas, útílimas, sem dúvida, para quem precisa digitar muito rápido e tem pouquíssimo tempo para fazê-lo. A velha taquigrafia já se prestava para isso há cem anos, através de sinais gráficos que significavam palavras e até frases inteiras.

Eu me refiro à capacidade de dialogar, de conversar, de manter um assunto qualquer em níveis interessantes.

Se admitirmos, por um instante, que conversar é trocar idéias, vamos admitir que idéias precisam ser expressadas de forma convincente para que não se tornem um código indecifrável. O elemento necessário à comunicação para que ela se torne inteligível é exatamente a expressão.

Expressar-se com eloqüência é o principal segredo dos grandes comunicadores. Haroldo de Andrade, Chacrinha, Silvio Santos são exemplos de comunicadores eloqüentes que, com verve, raciocínio rápido e carisma atraem e prendem a atenção dos ouvintes/telespectadores.

Haroldo e Chacrinha já faleceram, mas seus legados permanecem intocáveis e servem de haste para a construção de qualquer tese sobre comunicação e expressão. Daí mencioná-los no presente e não no passado.

Luciano Huck, de quem sou admirador, Fausto Silva, de quem deixei de ser depois que foi pra Globo e Serginho Groissman, o melhor dos três, apesar de ser o mesmo - e talvez por isso - há mais de vinte anos, são três belos exemplos de comunicadores relativamente jovens que têm o dom da comunicação e da expressão, mesmo cometendo gafes inaceitáveis o tempo todo.

Não vou entrar em detalhes sobre as gafes, porque não vêm ao caso, mas usá-las como motivos temáticos de uma conversa lingüística é uma boa idéia.

Vamos combinar o seguinte: a gente pode se comunicar muito bem, ou seja, ser desinibido, ter o raciocínio ágil para perguntar, responder, argumentar e contra-argumentar; pode se expressar de maneira convincente, mas falar mal.

Na festa do 'Criança Esperança', por exemplo, o Huck chamou acrobatas de acróbatas e foi prontamente corrigido pela Angélica. Aos ouvidos do povo, nenhum problema. Mas aos meu ouvidos foi um tiro de escopeta.

Fausto Silva é campeão de dizer que “fulano é um dos que mais vende discos no Brasil”, ou seja, dos que mais vende... fulano é um deles.

Nem sempre é falta de cultura. Quase sempre é vício de linguagem. E são exatamente os vícios de linguagem que vão dilapidando o idioma falado, o que, adiante, repercute na escrita e, posteriormente, na leitura. É por isso que os nossos jornais estão eivados de erros gritantes, sem que provoquem a mínima indignação.

Fulano e "ciclano" é inadmissível. Tanto quanto “pra mim fazer”, “eu não lhe vi”, e “a gente vamos”.

Mas basta ouvir uma entrevista dada por um político ou um comentário de um cronista esportivo, salvo raríssimas exceções, com um pouco mais de atenção e o resultado será sempre o mesmo: decepcionante.

Como queremos demonstrar, não basta ter o dom da palavra e capacidade para expressá-la. É preciso ter conteúdo. Ter realmente algo interessante para dizer. E isso não é coisa de papagaio.

Tudo começa no cérebro, no baú dos sintagmas.

Lingüisticamente falando ou escrevendo, usamos uma série de signos expressivos que denotam uma boa parte do que queremos comunicar. Parece complicado, mas não é. Até porque, eu, você, todo mundo, conscientemente ou não faz uso permanente do seu próprio baú de sintagmas.

Deixando a didática de lado, vamos simplificar usando o próprio contexto descrito até aqui para uma auto-explicação.

O que são sintagmas? São signos de quaisquer tipos, que tanto podem ser descritos por palavras, como por sons, sensações, sentimentos, odores, temperaturas, e assim por diante.

Não conseguimos explicar o que é o ar.

Podemos definir quimicamente do que se compõe o ar, mas ainda assim não o explicamos. O mesmo acontece com os sentimentos de amor, ódio, carinho, indiferença. Podemos demonstrar cada um deles, mas não podemos explicá-los de forma concreta.

Os sintagmas se encaixam em um eixo imaginário alocado horizontalmente no nosso cérebro. É o nosso baú.

Quando dizemos que vamos tomar banho, automaticamente nosso cérebro vai, de forma não-linear, buscar o que ele entende que faça parte de um banho.

Podemos facilmente indicar a água como elemento fundamental para um banho. Além da água, alguma forma de sabonete, shampoos, cremes, chuveiro, banheiro, aquecedor, torneira, espelho, tudo isso, mesmo que não esteja diretamente associado ao banho encontra-se dentro de um outro eixo, que corre verticalmente caçando sintagmas para levar para o banheiro.

Esquecemos a toalha, por exemplo.

Este eixo se chama Eixo Paradigmático e estabelece, de forma racional, um limite, um paradigma para cada ação que praticamos ao longo da vida, quando nos comunicamos mesmo que conosco.

Romper paradigmas é algo muito mais simples do que se pode imaginar. No paradigma banho, por exemplo, se raciocinarmos linearmente, um aparelho de som, um rádio, uma TV, não cabem nos limites paradigmáticos de um banho. Uma bola, para o banho de uma criança é um sintagma absolutamente primordial, mas para um adulto não é.

Nosso baú de sintagmas vai ficando mais rico na proporção em que vamos adicionando novos sintágmas a cada paradigma. E não é verticalizando o raciocínio que vamos conseguir fazer isso, mas horizontalizando-o, trazendo novos sintagmas que antes não faziam parte do time, simplesmente porque não havíamos pensado nisso antes.

Há clínicas especializadas em criatividade e lateralidade de raciocínio. Quem as freqüenta, principalmente, são executivos de altos escalões de mega corporações. Não para aprender o que já sabem, mas para incluir o que já sabem, já conhecem, onde aparentemente esse conhecimento não cabe.

A leitura é a forma mais eficaz de se aprender a lateralizar o raciocínio. Porque ao ler você é obrigado a imaginar, a preencher espaços, compor personagens, deduzir intenções e até arriscar palpites autorais em cada parágrafo. A leitura expande, enquanto a TV, o cinema e qualquer mídia áudio visual comprime, converge.

Não é tão simples criar um texto para um comercial de TV, porque o telespectador está atento ao que vê e o que está sendo visto não precisa ser dito. Reparem nos locutores de futebol que narram pelo rádio e nos que narram pela TV. Os radialistas são espetaculares, emocionais, explodem a cada jogada, enfeitam cada lance porque é o dever deles instigar a sua imaginação.

O slogan da Rádio Globo, quando era líder em transmissões esportivas era “Você vê o jogo, ouvindo a Rádio Globo”. Exatamente por isso.

Você descobre que é literalmente “tele”guiado, quando, no Maracanã, diante dos seus olhos, você vê que foi falta, mas precisa que o repórter diga que foi falta para que você tenha certeza absoluta. E nem sempre o que o repórter vê está mais próximo do que aconteceu do que aquilo que você mesmo viu.

A imagem induz e ilude. O som, ao contrário, instiga e enriquece a criatividade.

Laurie Anderson, artista performática, multimedia, disse em um dos seus shows, “Home Of The Brave”, que quando ela fala com as pessoas tenta parecer mais inteligente do que ela realmente é. E funciona”.

Funciona porque o baú de sintagmas dela está lotado até a tampa. Porque ela presta atenção em tudo que lê, que vê, que tem cheiro, cor, temperatura. E usa tudo isso em seus espetáculos. Ao vê-los o público urra e se emociona porque, simplesmente, "não havia pensado nisso".

Onde todos viram uma bicicleta, Picasso viu um touro: usou o celim como fuça e o guidom como chifres.

Tudo isso, lingüisticamente falando, é sintagma. E é dos sintagmas que precisamos para complementar o binômio comunicação + expressão.

Quem me lê regularmente deve perceber o quanto faço uso de orações intercaladas. Eu começo um assunto, dou uma volta, ilustro o que vou dizer a frente, preparo o leitor ou o ouvinte para em seguida, então, desferir o meu golpe mortal: a convicção.

Na comunicação a convicção é fundamental. E não existe convicção onde não existem argumentos consistentes.

Eu não sou o dono da verdade, não estou necessariamente certo em relação a qualquer assunto, mas o que você lê, em mim, é o resultado da minha convicção, da minha experiência sensorial passada para texto.

Argumentos são pílulas de sintagmas que se espalham pelo texto, de forma criativa e, quase sempre, de forma absolutamente inconsciente. O dom da comunicação é miscigenado o tempo todo pelas sensações que nos rondam 24 horas por dia.

Lamentavelmente, a produção em escala tomou o lugar da qualidade do conteúdo.

Hoje, um ator que dance, escreva, dirija, produza, atue e dê entrevistas, mesmo que faça tudo isso de forma medíocre é respeitado e enaltecido como um gênio.

Já não se fazem mais, Silveiras Sampaios como antigamente.






Sampaio, Silveira (1914 - 1964)

Biografia

José Silveira Sampaio (Rio de Janeiro RJ 1914 - idem 1964). Autor, ator, diretor e empresário. Homem de teatro, implementador de um estilo cômico intrinsecamente ligado à cultura carioca dos anos 50 e 60.

Forma-se em 1935 em pediatria pela Faculdade Nacional de Medicina. Ainda é estudante quando vence o Concurso de Novos Autores, promovido pelo Jornal do Brasil, com Futebol em Família, texto escrito em parceria com Arnaldo Faro, encenado no Teatro São José em 1931. Em 1947, funda o grupo amador Os Cineastas e escreve, dirige e produz o filme Uma Aventura aos 40. Filma também As Sete Noivas do Barba Azul, que permanece inacabado.

O primeiro sucesso acontece em 1948, quando apresenta A Inconveniência de Ser Esposa, na companhia de Aimée. A forma como Silveira Sampaio se torna, além de autor, também diretor e protagonista do espetáculo constitui um episódio inesperado: durante um ensaio, sua interferência com o intuito de orientar a interpretação do ator é mal recebida por este e pelo diretor do espetáculo e os dois abandonam a montagem. Na substituição de ambos, o autor revela sua vocação para o teatro. O autor, transformado em ator e diretor, assume em seguida a função de empresário e aceita ocupar o Teatro de Bolso (pequena sala de espetáculos que na época ficava na Praça General Osório, em Ipanema, e mais tarde se transferiria para o Leme, bairro vizinho, também localizado na zona sul carioca) para encenar seus textos. Desenvolve ali um estilo peculiar de comédia, que o crítico
Yan Michalski, no livro Ziembinski e o Teatro Brasileiro, descreve como "um tipo de comédia sofisticada inconfundivelmente carioca" e observa, sobre a estréia, no mesmo teatro, das primeiras encenações do diretor polonês no Rio de Janeiro: "A marca registrada que Silveira Sampaio imprimiu àquela sala era tão forte, que seria impensável Ziembinski produzir ali qualquer repertório que fugisse ao gênero comédia. Ainda que as duas produções desse gênero que ali lançaria fossem radicalmente diferentes do tipo de comédia criado por Sampaio, e que só este, com sua peculiar personalidade, sabia cultivar".1

Em 1949, recebe a Medalha de Ouro da Associação Brasileira de Críticos Teatrais, ABCT, pela direção de
Um Deus Dormiu Lá em Casa, de Guilherme Figueiredo.

Em 1953, sai do Teatro de Bolso e passa a ocupar o Teatro Serrador, onde estréia um novo texto, O Diabo em Quatro Corpos, com Mara Rúbia no elenco. Depois de uma experiência no teatro musicado, a convite de Carlos Machado, Sampaio se estabelece em uma pequena boate do Hotel Glória, onde cria No País dos Cadillacs, 1956.

Na televisão, usa seu estilo crítico para trabalhar como comentarista político e inventa telefonemas para a Casa Civil e para o próprio presidente, o que o torna uma figura popular, que o leva a ser incluído em delegações oficiais e viagens do Itamaraty ao exterior.

Logo depois de sua morte, em 1964, sua peça mais recente, Da Necessidade de Ser Polígamo, estréia em Nova York, traduzida para o inglês por Roberto de Campos, então ministro do Planejamento e encenada com elenco, diretor e produção americanos. Sua comédia mais conhecida é Só o Faraó Tem Alma, 1950, que teve versão para a televisão com sua metáfora bem-humorada sobre a desigualdade social.

Lopes Gonçalves define seu estilo: "... o traço marcante da sua obra consiste em apresentar o aspecto grotesco dos nossos costumes, mas sem exagero algum, longe da deformação caricatural, apenas cingido a fazer ver melhor o que há de desconexo ou contraditório no fundo lógico de ocorrências. Surgiu, assim, uma série de obras de extraordinária naturalidade dentro da sua originalidade, de agradável leveza firmada em propósitos de conduzir o espectador, ou o leitor, a observações sem esforço, sem dar por isso. E nessa linha sutil de bom humor levemente mordaz conduziu o escritor a sua maneira de atuar no palco, maciamente a envolver o público nas malhas de filósofo zombeteiro e generoso".2

Notas

1. MICHALSKI, Yan. Ziembinski e o teatro brasileiro. São Paulo/Rio de Janeiro: Hucitec/Funarte, 1995. Página 167.
2. GONÇALVES, Lopes. Silveira Sampaio, Revista de Teatro, Rio de Janeiro, SBAT, novembro-dezembro de 1964, página 4.

TEXTO EXTRAÍDO DO WEBSITE DA ENCICLOPÉDIA IATAÚ CULTURAL
http://www.itaucultural.org.br/aplicexternas/enciclopedia_teatro/index.cfm?fuseaction=personalidades_biografia&cd_verbete=848

Um comentário:

  1. "Estou?" (ao atender o telefone) Não sei não! Com acordo ou sem acordo eu continuo a não entender a pergunta de quem atende um telefone sem saber de si. E com esta noção mudo de assunto. Podemos comparar a música portuguesa com a brasileira? Da ditadura a explosão das "Diretas já!"? Dos anos 1960 aos 1980? E antes disso e depois disso? Mas, e o humor do "Gato Fedorento"? Chico e Jô me acudam! De certa forma acredito na qualidade do povo brasileiro. Bem, o que talvez queira dizer é que, talvez, "não estou" aqui! "Estou?"

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